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Boas Práticas | Entrevistas No Maranhão, Regime de Colaboração foi a alavanca para guinada na educação set | 2020
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Com a implementação de uma série de políticas que incluem mudanças na gestão escolar, reforma de escolas e implementação do Regime de Colaboração, o Maranhão tem ganhado destaque nos últimos anos quando o assunto é Educação. Por isso, dando sequência à nossa série que busca dar luz às iniciativas voltadas à reorganização neste momento de pandemia, conversamos com o secretário estadual de Educação, Felipe Camarão. Confira.

Movimento Colabora Educação – Sabemos que no Brasil a coordenação e cooperação entre os sistemas federativos no campo da Educação é tarefa complexa. O compartilhamento e a sobreposição de responsabilidades são desafios observados em todos os estados. Como o Maranhão lidou e vem lidando com a questão? 

Felipe Camarão – No Maranhão, até 2015, havia pouca cooperação entre os municípios e muitos conflitos de interesses e objetivos entre os entes federados. Nesse contexto, institui-se o Plano Mais IDH, estratégia que tem como objetivo a ser atingindo pelo Governo do Estado, em colaboração com os municípios, o enfrentamento e a redução da extrema pobreza, e a promoção de justiça social e cidadania para as populações mais vulneráveis.

Como ação a ser desenvolvida pela Secretaria de Educação no âmbito do plano, foi instituído o Programa Escola Digna, inicialmente voltado à substituição de escolas de taipa, barro e palha existentes em todo o estado por estruturas de alvenaria, que tinha como cerne a colaboração e a cooperação com  municípios e secretarias municipais de educação.

Conforme avanços nas análises dos dados educacionais dos municípios, no conhecimento do território e na construção de uma relação de confiança, observamos que, além das condições precárias da estrutura física das escolas, havia uma demanda acentuada por transporte escolar, por qualificação profissional dos gestores e professores, e por materiais didáticos e insumos que auxiliassem a promoção da aprendizagem, pela alfabetização de jovens, adultos e idosos. E esses aspectos passaram a compor a cooperação com os municípios.

Com o engajamento a essa pauta, o Programa Escola Digna foi ampliado e transformado no Pacto pela Aprendizagem, que hoje conta com a adesão de 216 municípios.

Atualmente, articulamos uma política para fortalecer o Regime de Colaboração por meio de um programa que contribua para elevar os índices de alfabetização na idade certa. Busca-se intensificar os processos de formação continuada para os professores e gestores escolares da Educação Infantil e dos 1º e 2º anos do ensino fundamental.

O Regime de Colaboração é, indiscutivelmente, uma oportunidade para o alcance dos resultados positivos na oferta de uma educação pública, gratuita e com qualidade. Além de ser capaz de assegurar a aprendizagem dos estudantes e reduzir as desigualdades educacionais do Brasil.

 

O Regime de Colaboração no estado é institucionalizado? Se sim, olhando para todo o percurso, você diria que o esforço para institucionalização da colaboração na política educacional tem sido uma chave para o sucesso? 

Sim.  O Regime de Colaboração é institucionalizado por meio da Lei nº 10.995, de 11 de março de 2019, que estabelece a Política Educacional Escola Digna e pelo Decreto n° 34.649, de janeiro de 2019, que regulamentou o Pacto pela Aprendizagem.

A instituição das ações do regime por regulamentos e termos de cooperação sanam, em parte, a ausência de uma norma regulamentadora nacional que estabeleça as formas de cooperação entre estado e municípios, possibilitando o estabelecimento, em nível estadual, das responsabilidades e compromissos entre os entes federados, contribuindo para o sucesso das ações e dando segurança aos municípios que trabalham conosco.

É difícil falar sobre a importância do Regime de Colaboração para professores, funcionários das redes e famílias? Como “traduzir” ou “exemplificar a importância” dessa forma de atuar na Educação? 

A cooperação com os municípios não se limita à interlocução e à atuação no nível estratégico com as prefeituras e secretarias municipais de educação. Vai além. Impacta diretamente na vida dos estudantes e professores, tornando-se visível no dia a dia das escolas públicas do território. Permite que os gestores públicos, professores e servidores, das diversas redes compreendam e materializem o conceito de cooperação mútua, ampliem o olhar sobre o fato dos estudantes pertencerem ao território e não ao ente público estadual e municipal, e isso traz ganhos significativos, como:

  • A busca por metas e resultados educacionais de forma conjunta e coordenada em toda rede, em torno da aprendizagem dos estudantes;
  • Alinhamento de ações educacionais, com garantia da continuidade dos estudos e da vida acadêmica dos estudantes que, por vezes, iniciam numa rede, migram e/ou concluem seus estudos em outra;
  • Economia dos recursos públicos, hoje tão escassos, o que favorece a maximização dos investimentos na sala de aula, com impacto na vida de professores, funcionários, estudantes e família;
  • Continuidade das ações educacionais e implementação de soluções permanentes, pois a longevidade das políticas também é fator determinante para o sucesso, para correção dos processos e desenvolvimento de expertises.

 

Gostaria de trazer o assunto para o momento atual: a pandemia de Covid- 19. Como foi essa jornada? O estado e os municípios usaram da colaboração para pensarem saídas comuns? 

Inicialmente todos fomos surpreendidos pela pandemia, não havia um plano de contingência prévia para a pandemia. As ações propostas pelo Ministério da Educação não foram dialogadas e discutidas com as secretarias de estado e com os municípios . E, de fato, até hoje não temos nacionalmente um plano estruturado e impactante de mitigação, suporte e estruturação das escolas, de ampliação da conectividade, de garantia de biossegurança e nem aporte ou rubricas específicas para o desenvolvimento dessas iniciativas.

educação no maranhão

Secretário estadual de Educação do Maranhão, Felipe Camarão

Neste cenário, estados e municípios tiveram que criar suas próprias soluções. Quanto menor a conectividade das localidades para o ensino remoto, maior o desafio. Esse é o caso do Maranhão, por exemplo.

Houve nesse processo um período de letargia de alguns entes públicos. Muitos pensavam que seria apenas um mês de suspensão, mas não foi o caso. Para enfrentar a emergência, lideramos a discussão reunindo os diversos órgãos e secretarias, buscando ampliar o conhecimento sobre o atual cenário, encontrar soluções factíveis à nossa realidade e traçar protocolos de biossegurança que viabilizassem o retorno presencial ou híbrido.

No contexto da cooperação com os municípios, atuamos, coletivamente para  regulamentação pelo Conselho Estadual de Educação da Resolução CEE/MA – Nº 94/2020, que fixa orientações para o desenvolvimento  das atividades curriculares e a reorganização dos calendários escolares, excepcionalmente, enquanto permanecerem as medidas de prevenção à Covid-19, para as Instituições integrantes do Sistema Estadual de Ensino do Maranhão.

Realizamos ainda a curadoria de materiais de suporte ao ensino remoto e buscamos a formalização de parcerias que favorecessem o desenvolvimento das  atividades não presenciais,como o “Projeto Aprender dentro e fora da escola”, desenvolvido em parceria com o Laboratório de Educação, voltado para as crianças da educação infantil e do “Simplifica em Rede” destinado às crianças do ensino fundamental.

 

Qual sua avaliação sobre as lideranças institucionais durante a crise em nível nacional?

Em que pese a emergência global decorrente do coronavírus e os impactos à vida das pessoas e, sobretudo, ao cenário educacional, há aspectos positivos a serem pontuados, especialmente no que tange à cooperação e ao Regime de Colaboração, entre os entes federados (com exceção da União, especificamente o MEC).

O Conselho Nacional de Educação, o Consed e a Undime, ouso dizer, estão coordenando as discussões nacionais sobre a temática e promovendo uma ampla e sólida cooperação entre os diversos interessados,  buscando parcerias e soluções para os diversos problemas que foram agravados no atual cenário. Isso não se dá apenas por meio dos debates e socialização do conhecimento, mas, especialmente, pela materialização de orientações, de procedimentos e da definição de percursos a serem seguidos e, ainda, com a busca de parceiros da iniciativa privada, das instituições filantrópicas e instituições de ensino superior, que estão contribuindo e fazendo pontes entre a realidade atual e um futuro ainda muito desconhecido, pós-Covid 19.

 

Como está sendo pensado o retorno às aulas presenciais? Qual a estratégia central? Como o Regime de Colaboração pode fortalecer o esforço para a volta às aulas? 

Considerando o contexto da pandemia e os diferentes tempos de contágio do vírus, as redes municipais buscaram adaptar-se às suas realidades seguindo as orientações dos documentos normativos e recomendações sanitárias dos órgãos de saúde. O atual decreto do Governo do Estado dá autonomia aos municípios para decidirem quando se dará o retorno às aulas presenciais.

Hoje, o Maranhão junto com UNICEF, já desenvolve ações de Busca Ativa Escolar em 202 municípios e a orientação é que seja intensificada para minimizar os índices de abandono escolar, considerando o longo período de isolamento social e o distanciamento da escola.

Quanto à avaliação diagnóstica, o estado, em parceria com o CAED, aplicará avaliação com todos os estudantes das redes municipal e estadual para diagnosticar os níveis de aprendizagem e a reorganização curricular.

 

Você apostaria que, após o debate sobre o Fundeb, o Sistema Nacional de Educação (SNE) poderá ganhar  destaque no Congresso? Por quê essa agenda é tão importante? 

A pandemia destacou todas as nossas desigualdades, descortinando a escassez de recursos da área educacional, a falta de infraestrutura das escolas públicas e, principalmente, a situação de vulnerabilidade da maioria dos nossos estudantes. Então, tivemos a demonstração, na experiência empírica, da importância da atuação coordenada, colaborativa e sistêmica dos entes federados. Por isso, a institucionalização do SNE deve ser o próximo passo, visto que é fundamental para o enfrentamento dos desafios educacionais e para a democratização de uma educação pública e de qualidade para todos. O principal objetivo do SNE é promover a organização da educação dando organicidade às políticas públicas e assegurando o direito constitucional à educação de forma justa igualitária em todo território nacional.