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Reportagens Pauta sobre volta às aulas presenciais movimenta o debate público no país ago | 2020
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Não há consenso quando o assunto é a volta às aulas presenciais no Brasil. Especialistas em saúde, governos em níveis federal, estadual e municipal, organizações do campo da Educação, professores, famílias e alunos têm debatido nas últimas semanas quando – e como – acontecerá a retomada do ano letivo nas escolas, fechadas há quase cinco meses por conta da pandemia de Covid-19.

Ultrapassada a marca 100 mil mortos por conta da doença e com altos índices de contágio em diversas regiões do país, o cenário ainda gera grande preocupação. Especialistas em epidemiologia, quase em sua maioria, afirmam que o fluxo de pessoas, não só nas escolas, mas em todo o percurso territorial que o movimento gera, pode aumentar o contágio e colocar em risco não só alunos, professores e funcionários, mas toda uma comunidade. Por outro lado, sabe-se que os prejuízos em termos de aprendizagem dos estudantes se tornam cada vez maiores com o distanciamento social e a perda de vínculo entre aluno e escola. Muitos órgãos já se posicionaram.

O Conselho Nacional de Educação (CNE), instância normativa que assessora o Ministério da Educação (MEC), emitiu em julho o Parecer CNE/CP Nº 11/2020, com orientações educacionais para a realização de aulas e atividades pedagógicas presenciais e não presenciais no contexto da pandemia. O documento já foi homologado pelo MEC no último dia 31. Em suma, a recomendação orienta para um modelo híbrido que considere aulas na escola e também atividades não presenciais.

Outro ponto que merece grifo diz respeito à recomendação de flexibilização do controle de frequência escolar, isto é,  o CNE escolheu se posicionar pela maior autonomia das famílias frente à decisão de permitir ou não que os estudantes frequentem as escolas.

 

O desafio do diálogo e da cooperação

Importantes organizações, como a Undime – instituição que congrega os dirigentes responsáveis pela gestão da educação pública nos 5.568 municípios do país -, defendem comissões municipais e escolares, além de uma comissão estadual com representação dos municípios. A principal recomendação é que o debate sobre a volta às aulas não seja precipitado, que tenha caráter participativo e trate caso a caso, considerando as características regionais. O Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), outra referência no campo, também se posiciona pela articulação intersetorial e em Regime de Colaboração dos protocolos de retorno.

A nota da Undime também chama a atenção para a necessidade de uma avaliação criteriosa do cenário: “(…) a decisão sobre a retomada, ou não, das aulas presenciais deve ser tomada pelos chefes do poder executivo, ouvidas as autoridades sanitárias, da Saúde, da Educação e da Assistência Social. Somente com evidências científicas e com uma análise detalhada do alcance da Covid-19 será possível avaliar as possibilidades, os desafios e os riscos para tal retorno.

No legislativo, a pauta também está em debate. O tema é matéria do Projeto de Lei 2949/2020, em trâmite no Congresso. O texto ressalta a importância do diálogo e do olhar focado na localidade: “Acreditamos que a Estratégia para o Retorno às Aulas deve ser desenhada no âmbito de cada sistema e as ações desenvolvidas em Regime de Colaboração.”

Nesse sentido, emerge a discussão sobre a importância do Regime de Colaboração. Como apresentado em diversos relatos de gestores educacionais na nossa série especial “A colaboração em tempos de pandemia”, pensar a educação de forma sistêmica, considerando os diversos entes federativos e pares na gestão pública é estratégia potente para o enfrentamento da crise. De alguma forma, a pandemia evidenciou a importância do Regime de Colaboração para a garantia do direito à educação.

O próprio Projeto de Lei destaca este ponto: “A composição de comissões responsáveis pela estratégia de retorno deve ser definida em cada sistema, obedecidas algumas representações necessárias: órgãos responsáveis pela educação, saúde e assistência social e conselhos de educação, diretores de escola, professores”.

O ponto central das discussões, tanto dos posicionamentos do Consed e da Undime, quanto do projeto de lei mencionado, está na importância de garantir uma articulação intersetorial e coordenada. O momento requer esforços conjuntos e um regime de colaboração efetivo entre os diversos atores educacionais e governamentais.

Enquanto o debate público acontece, estados e municípios começam a planejar a retomada das aulas presenciais, cada um a sua forma. Enquanto no Amazonas, mais de 100 mil alunos da rede pública de Manaus já voltaram para o “chão da escola”, no estado de São Paulo, epicentro da pandemia, a previsão de retomada é para o dia 8 de setembro. Longe da unanimidade, a pauta sobre a volta às aulas presenciais segue na agenda pública e mobiliza opiniões diversas do campo político e na própria sociedade civil.

“Uma coisa é certa: no pano de fundo deste debate, o fator “colaboração”, que se traduz na necessidade de articulações e decisões conjuntas, está emergindo cada vez mais como relevante em qualquer esforço de buscar soluções para o momento atual. E, certamente, para o futuro, quando será mais do que nunca necessário lidar com questões comuns a todas as redes, avalia Fernanda Castro, do Movimento Colabora Educação.