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Fundamentos


A colaboração é, indiscutivelmente, um caminho propício para alcançar resultados positivos na oferta de uma educação de qualidade. Mais que isso, entendemos que ela seja necessária para assegurar a aprendizagem dos estudantes e que seja um caminho potente para reduzir as desigualdades que existem no Brasil. Disparidades refletidas, inclusive, em grandes diferenças entre os índices de aprendizagem entre Municípios, Estados, ou mesmo dentro de uma dada rede municipal ou estadual.

O compromisso com a colaboração deve ser, portanto, um compromisso de todos, mas você, como Gestor/a de educação da rede estadual, tem uma capacidade de liderança única na condução desse processo. Coloca-se à sua frente a oportunidade de ser empreendedor/a de uma transformação tão demandada pela sociedade. Este guia visa ajudar a dimensionar, planejar e implementar essa empreitada.

quais são as vantagens de atuar em regime de colaboração?

O processo de ensino e aprendizagem é amplo e complexo e são diversos os atores que nele atuam, tanto na escala local – se pensarmos na escola e na comunidade de educadores que ali trabalha (professores, coordenadores, diretor) – como na escala macro, se pensarmos na educação em suas dimensões nacional, estadual e municipal e as responsabilidades que cabem a cada ente federado.

A dinâmica educacional exige colaboração para que os atores envolvidos e os fatores que interferem em sua atuação estejam articulados e, por isso, é fundamental que os esforços das diferentes esferas governamentais se organizem de forma conjunta e em torno de um bem maior – a aprendizagem de todos os estudantes.

Relacionamos abaixo alguns pontos que evidenciam as vantagens de atuar em colaboração:

pontos-chave

garantia da trajetória escolar

O regime de colaboração permite a harmonização das orientações gerenciais e pedagógicas das redes estadual e municipais. As principais vantagens disso são:

  1. Garantia da trajetória escolar fluída e coerente aos estudantes;
  2. Facilitação da migração de professores e alunos entre redes e municípios.
economia de recursos

Muitas atividades podem ser otimizadas quando feitas conjuntamente por estado e municípios. Essa economia de recursos pode ser:

  1. Financeira, por meio de atividades de gestão (como transporte, distribuição de merenda, aplicação de avaliações) ou pedagógicas (como formação de professores, material didático);
  2. Não-financeira, por meio da integração de sistemas de informação, assessoria técnica ou cessão de servidores.
melhoria dos insumos pedagógicos

A aprendizagem do aluno deve ser o objetivo central de qualquer política pública educacional. E o regime de colaboração possibilita a melhoria de insumos importantes para isso:

  1. Uma base curricular de referência e diretrizes comuns impacta os materiais didático;
  2. Formação elaborada para educadores que atuam nas duas redes;
  3. Modelo único de avaliação;
  4. Troca de experiências entre educadores.
continuidade de políticas públicas

Políticas sociais no Brasil são marcadas pela descontinuidade. Agravam essa característica eleições a cada dois anos. Tais fatores dificultam políticas colaborativas de longo prazo.

De outro lado, a implementação do regime de colaboração contribui para a continuidade e melhoria das políticas públicas porque:

  1. Congrega forte compromisso político, inclusive em situações de alternância de poder político partidário;
  2. Cria visibilidade e pressão entre pares;
  3. É institucionalizada via mecanismos legais.
promoção da equidade

Políticas públicas em regime de colaboração são por natureza promotoras de equidade. Isso ocorre porque:

  1. Contemplam a trajetória do aluno como um todo e não uma etapa ou ente específicos;
  2. Implicam numa visão territorial na qual o Estado apoia todos os Municípios e, se preciso, amplia a assistência para os prioritários;
  3. Podem induzir a cooperação entre Municípios, regiões e/ou escolas.

Alunos que migram de escolas municipais para estaduais, ou vice-versa, são beneficiados quando há maior alinhamento no funcionamento entre as duas redes. Reduzem-se assim os choques pedagógico, organizacional e cultural da transição. A mudança dos educadores, dos colegas e do ambiente escolar são inevitáveis, mas quanto mais pontos em comum houver na proposta pedagógica e no funcionamento geral das escolas do mesmo território, mais fluida será essa mobilidade entre redes. O aluno deve ser o centro de toda e qualquer política educacional e sua plena trajetória escolar garantida pelo Estado e pelos Municípios conjuntamente.

No caso do currículo feito em colaboração, o aluno dará seguimento à progressão dos conhecimentos e dos direitos de aprendizagem comuns às escolas das diferentes redes. Além disso, facilita-se a preparação de aulas para professores que trabalham tanto na rede estadual como na municipal.

Outro aspecto que merece ser destacado é o planejamento do calendário, das matrículas e da formação dos educadores nas diferentes etapas: quando feito conjuntamente pela rede estadual e municipal, aprimora-se a oferta nos diferentes bairros e comunidades, evitando-se assim prejuízos como no deslocamento dos alunos e professores.

A colaboração possibilita a otimização de recursos materiais e financeiros, como a partilha de veículos no transporte de alunos das redes estadual e municipal. Se a colaboração for ampliada para o âmbito técnico, é possível pensar em otimizar também recursos humanos, como compartilhamento de pessoal ou de serviços de assessoria ou formação, que podem ser contratados por mais de uma rede.

Com uma maior colaboração entre secretarias estadual e municipais, e a elaboração/implementação conjunta do currículo de referência do Estado, pode-se otimizar a gestão e melhorar a qualidade dos insumos necessários para assegurar uma boa prática pedagógica: currículo, materiais didáticos, formação de educadores e avaliação de desempenho. São questões que demandam custos e esforços nem sempre disponíveis em cada rede e que podem ser aprimorados, se forem objeto de uma atuação articulada entre Estado e Municípios.

Atuar colaborativamente também facilita a contratação de especialistas e o investimento na formação dos profissionais que trabalham em mais de uma rede em um mesmo território. Possibilita um modelo único de avaliação dos alunos e a produção e disponibilização dos materiais em maior escala. Além disso, favorece a troca de experiências entre redes, escolas e educadores, que podem aprender com os êxitos e erros uns dos outros e construir soluções de forma cooperada para problemas comuns.

Especialmente em casos em que o regime de colaboração é institucionalizado, amparado por mecanismos legais e incorporado ao funcionamento das instâncias públicas, a articulação entre Estado e Municípios contribui para que as políticas públicas de qualidade não se percam em meio às oscilações bienais causadas pelas eleições municipais e estaduais.

No caso de Municípios com equipe técnica limitada e em que há grande rotatividade dos profissionais, ter o Estado ou outros Municípios envolvidos na política colaborativa pode contribuir também para preservar a memória do que foi feito e a manutenção dos processos e fluxos já estabelecidos.

A promoção da equidade deve ser um princípio inerente ao trabalho colaborativo, com uma visão do território como um todo e não das diferentes redes ou de grupos de escolas. Isso pode ser acentuado quando os entes se empenham em criar diferentes formas de reduzir as desigualdades educacionais, tais como políticas que induzem a cooperação entre escolas ou oferta de suporte especial às localidades com mais necessidades. Sem colaboração, as localidades com menos recursos financeiros e técnicos tenderão a ter piores resultados educacionais.

Quais são as formas de colaboração federativa entre estados e municípios?

Pedagógicas

Possíveis atividades

  • Suporte ao desenho de processos pedagógicos e de gestão das secretarias municipais;
  • Apoio à solicitação de recursos ao PAR;
  • Apoio à adesão de programas federais;
  • Apoio à construção e ao monitoramento dos Planos Municipais de Educação.

Benefícios potenciais

  • Maior quantidade de recursos para a educação do Estado;
  • Programas mais alinhados em termos pedagógicos.

Pontos-chave para implementação

  • Formação robusta dos servidores responsáveis por realizar esses apoios;
  • Equipe precisa ter boa articulação com a equipe dos municípios.

Possíveis atividades

  • Compartilhamento das provas de avaliação externa e da devolutiva pedagógica.

Benefícios potenciais

  • Redução do custo unitário da avaliação;
  • Maior alinhamento pedagógico das devolutivas e programas provenientes dos resultados;
  • Possível melhoria na qualidade dos itens.

Pontos-chave para implementação

  • Envolvimento dos municípios na validação das provas para garantir que não haja nenhum efeito de regionalismo;
  • A devolutiva da prova precisa ser pensada com a visão das redes municipais e chegar até os municípios.

Possíveis atividades

  • Desenho conjunto do Currículo do território do estado;
  • Definição e compra conjunta dos materiais didáticos;
  • Formação para gestores e professores para definição de compra dos materiais didáticos.

Benefícios potenciais

  • Alinhamento da política pedagócia dentro do território do estado;
  • Redução do custo unitário de compra de materiais didáticos;
  • Melhoria da qualidade do currículo (leva em conta diferentes realidades e mais pessoas debruçadas sobre o documento) e dos materiais didáticos (processo de compra feito com mais profundidade).

Pontos-chave para implementação

  • Alinhamento inicial sobre as diretrizes curriculares;
  • Atenção às especificidades regionais;
  • Materiais didáticos precisam embasar a formação dos professores.

Possíveis atividades

  • Construção de materiais de formação iguais, ou alinhados, para redes estaduais e municipais;
  • Oferecimento de cursos e formação continuada mais padronizados, presenciais ou a distância, para todas as redes;
  • Alinhamento dos processos entre as diferentes redes.

Benefícios potenciais

  • Maior equidade na formação dos formadores locais;
  • Processos melhores devido à troca de experiências entre gestores e professores;
  • Menor deslocamento dos multiplicadores.

Pontos-chave para implementação

  • Os materiais utilizados na formação precisam ser baseados nos materiais didáticos;
  • Levar em conta diagnósticos e planos de ação elaborados com base nas avaliações;
  • Considerar as variações regionais (o material não pode ser o mesmo para todo o território).

Possíveis atividades

  • Ações de comunicação para todo o estado, usando diferentes canais (órgãos de controle, impressa oficial, TV, etc).

Benefícios potenciais

  • Maior envolvimento da comunidade, professores e gestores.

Possíveis atividades

  • Produção de materiais específicos para essa etapa e que levam em consideração a realidade local;
  • Formação dos professores com materiais comuns para diferentes municípios.

Benefícios potenciais

  • Maior engajamento do aluno;
  • Menor risco de comprometer o aprendizado do aluno caso ele/ela mudem de rede;
  • Redução da distorção idade-série.

Pontos-chave para implementação

  • Ser consolidado como programa de Estado é fundamental para sua continuidade.

Possíveis atividades

  • Construção de metodologias para identificar alunos que tenham maior probabilidade de evadir/abandonar;
  • Desenhar um processo de apoio a esses alunos e suas famílias em conjunto com outras secretarias e órgãos estaduais e municipais (Ex: Conselho Tutelar, Procuradoria, etc).

Benefícios potenciais

  • Programas mais completos e robustos, aumentando a chance de resultados positivos.

Pontos-chave para implementação

  • Entender que a situação de vulnerabilidade pode se dar por diferentes contextos (familiar, econômico, comportamental, saúde, etc);
  • Coordenação com diferentes órgãos e secretarias precisa ser muito bem organizada.

Gestão

Possíveis atividades

  • Definir um calendário comum para as redes estaduais e municipais.

Benefícios potenciais

  • Irmãos que estejam em diferentes redes começam sempre na mesma data;
  • Professores que atuam em difrentes redes têm maior chance de combinar os períodos de férias.

Pontos-chave para implementação

  • Atenção aos diferentes feriados;
  • Risco de uma rede entrar em greve e dificultar essa unificação.

Possíveis atividades

  • Definição de um padrão mínimo de qualidade dos processos e da infraestrutura;
  • Compartilhar profissionais que realizam as inspeções;
  • Formação comum para esses profissionais.

Benefícios potenciais

  • Maior segurança para os alunos, dado que problemas tem maior chance de serem identificados;
  • Maior homogeneidade na infraestrutura física entre diferentes redes.

Pontos-chave para implementação

  • Check-list de inspeção precisa ser muito bem discutido e intuitivo.

Possíveis atividades

  • Criação de um processo (procedimento e documentação) comum para todo o estado.

Benefícios potenciais

  • Maior facilidade para os alunos fazerem matrículas, dado que eles poderiam fazer em escolas de diferentes redes, apesar de escolherem a escola/rede/município que estudarão;
  • Aumento da qualidade do cadastro dos alunos e das famílias.

Pontos-chave para implementação

  • Formação dos servidores que farão esse processo de matrícula.

Possíveis atividades

  • Criação de mecanismos de incentivo para a melhoria do aprendizado e da colaboração diferentes redes e escolas (ex: repasse de ICMS, premiação, reconhecimento, etc).

Benefícios potenciais

  • Maior engajamento dos gestores e professores com o aprendizado dos alunos.

Pontos-chave para implementação

  • Os mecanismos precisam premiar os melhores e os com maior ganho, mas também não podem desistimular os que performam mais abaixo;
  • Engajamento da classe política.

Possíveis atividades

  • Análise de demanda educacional no território do município;
  • Compartilhamento de prédios caso demanda de cada rede não seja suficiente para encher um prédio todo;
  • Tomada de decisão sobre abertura e fechamento de sala feita em conjunto (estado e município).

Benefícios potenciais

  • Aumento do acesso à educação em diferentes etapas de ensino.

Pontos-chave para implementação

  • Necessário um planejamento de médio/longo prazo;
  • Cuidado para não aumentar a oferta de cursos noturnos (uma tentação ao se analisar ocupação das escolas), que normalmente não possuem a mesma qualidade dos diurnos.

Possíveis atividades

  • Identificação de perfis oceosos e escassos em cada rede;
  • Atuação de servidores em diferentes redes caso sua competência seja mais necessária em uma rede diferente da sua.

Benefícios potenciais

  • Redução do custo com pessoal;
  • Menor tempo de deslocamento de professores e gestores.

Pontos-chave para implementação

  • Alinhamento das regras de remuneração e benefícios.

Possíveis atividades

  • Cessão temporária de prédios, equipamentos e mobiliário que estiverem ociosos em uma rede e faltando em outra.

Benefícios potenciais

  • Redução de custos de aluguel.

Pontos-chave para implementação

  • Necessário um planejamento de médio/longo prazo.

Possíveis atividades

  • Compartilhamento de rotas e veículos para transporte de alunos de diferentes redes.

Benefícios potenciais

  • Redução do custo de transporte e do tempo de deslocamento dos alunos.

Pontos-chave para implementação

  • Geolocalização acurada dos alunos e das escolas é essencial para um bom desenho da malha de transporte.

O que se espera de um empreendedor de políticas públicas?

Para alcançar essas vantagens, é fundamental uma liderança capacitada e comprometida. Empreender uma política pública requer legitimidade, habilidade de comunicação, capacidade de articulação, trânsito político com poder decisório, habilidade de negociação, persistência e disponibilidade de investimento. É preciso dialogar com a comunidade, identificar problemas e apresentar ideias que façam sentido para a melhoria da qualidade de vida da comunidade, em seu sentido mais amplo.

Além disso, é necessário avaliar – com o apoio de sua equipe, especialistas, acadêmicos, funcionários públicos – se a estrutura governamental atende à demanda que se coloca e, se necessário, promover mudanças na organização da secretaria para melhorar seu funcionamento. Pode não ser o caso de alterar cargos, mas de estabelecer novas funções e fluxos de trabalho, considerando expertises e “vocações” individuais. O desafio de desenhar e implementar uma política colaborativa pode ser uma grande oportunidade para você, Gestor/a, fazer valer esse papel de articulação dos atores em seu Estado.

Tamanha responsabilidade exige disposição para a aprendizagem constante, o diálogo e a persistência. Para poder exercer essa liderança com legitimidade, é importante acompanhar o que está acontecendo em sua secretaria e nos Municípios, escutar suas equipes, ler relatórios, compreender os desafios e assumir junto com eles a responsabilidade pelo êxito da política.

O caso Ceará

Um dos maiores exemplos de empreendedorismo em políticas públicas na educação brasileira é o Programa de Alfabetização na Idade Certa (PAIC). O programa cearense foi instituído como política do governo estadual em 2007, acompanhado de diversas ações de apoio e incentivo às redes municipais. Ao longo dos últimos 12 anos, o programa expandiu seu escopo inicial de melhoria da alfabetização para todo o Ensino Fundamental e a Educação Infantil, garantindo que todos os municípios alcançassem um desempenho de destaque no país. A melhoria substancial nos resultados educacionais do Ceará só foi possível porque o PAIC começou com uma perspectiva municipalista, inspirado nas práticas locais e articulado por um setor dentro da Secretaria Estadual de Educação que coordena a cooperação com as secretarias municipais de educação.

O regime de colaboração na educação cearense data do apoio à municipalização na década de 90, que já na época foi seguido de ações de apoio aos municípios. Paralelo a esse movimento da rede estadual, líderes políticos e empreendedores de políticas públicas estavam realizando transformações significativas na educação municipal. No começo dos anos 2000 o caso de Sobral começou a ganhar destaque devido à melhoria substancial de seus indicadores educacionais, especialmente na alfabetização e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Ainda no final da década, algumas das lideranças responsáveis pela exitosa transformação de Sobral passaram a atuar no âmbito estadual, tanto no legislativo quanto no executivo. Esta atuação levou à criação do Comitê Cearense para a Eliminação do Analfabetismo Escolar na Assembleia Legislativa do Ceará em 2004, que inspirou a criação da Coordenadoria de Cooperação com os Municípios (COPEM) na Secretaria Estadual de Educação em 2007, área responsável pela implementação do PAIC.

A COPEM foi criada inicialmente com o foco de erradicar o analfabetismo escolar no estado e posteriormente ampliou seu escopo para um regime de colaboração mais amplo, com a finalidade de definir políticas e estruturar ações que contribuam para elevar a qualidade da Educação Infantil e de todo o Ensino Fundamental. A área conta com ações estruturadas em dois eixos: 1. Cooperação com os municípios para o desenvolvimento da aprendizagem na idade certa; 2. Educação e promoção social. As ações formuladas pela COPEM são articuladas pelas Coordenadorias Regionais de Desenvolvimento da Educação (CREDE) por meio de suas Células de Cooperação com os Municípios (CECOM). O desenho da governança em que um setor na SEDUC articula suas ações por meio de estruturas regionais empoderadas como representação do estado e simultaneamente bastante respeitosas da autonomia dos municípios permite que o estado esteja ainda mais próximo do contexto local e responda com maior agilidade e flexibilidade às demandas municipais.

As iniciativas de cooperação com municípios têm como objetivo fortalecer as secretarias municipais do ponto de vista técnico, pedagógico e gerencial, garantindo a estrutura adequada para que essas dimensões sejam desenvolvidas em sua plenitude. A área articula ações de assessoria técnica e pedagógica contextualizadas às necessidades de cada rede municipal. Entre as principais ações estão o desenvolvimento de marcos curriculares em diálogo com as redes municipais, a articulação da formação continuada de profissionais da educação e suporte aos gestores e professores no uso das avaliações externas para gestão do sistema educacional e desenvolvimento de intervenções pedagógicas. Além disso, a área apoia a gestão e desenvolvimento da infraestrutura das redes municipais por meio de iniciativas de ordenamento de rede, otimização de rotas de transporte escolar, cessão de servidores e construção e aquisição de prédios e mobiliário.

Para além das ações voltadas às secretariais municipais de educação como um todo e às iniciativas que são transversais a todas as etapas, como as orientações curriculares e formação de professores, a COPEM também desenvolve ações específicas para cada uma das etapas. Na Educação Infantil, a coordenadoria desenvolve o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Infantil (PADIN), um programa de visitas domiciliares e encontros coletivos com pais e cuidadores para possibilitar o desenvolvimento integral das crianças de 0 a 4 anos através do estímulo de processos de aprendizagem. Outra ação estruturante realizada na etapa que tem grande responsabilidade pelo aumento do atendimento na Educação Infantil é o financiamento (com contrapartida municipal) para a construção de Centros de Educação Infantil, seguida pela formação de seus gestores. No Ensino Fundamental, além da formação de professores e materiais didáticos voltados à alfabetização na idade certa, o estado também provê material didático e de literatura infantil e juvenil para toda a etapa. A COPEM também coordena as ações de reconhecimento e cooperação técnica entre as escolas promovidas pelo prêmio Escola Nota 10.

Essas ações só foram viabilizadas porque o processo de governança e pactuação com os municípios foi desenvolvido sob uma ótica municipalista e com respeito aos municípios e à sua autonomia como entes federados. Para isso, foi importante que as iniciativas fossem implementadas de forma incremental e dialogada, garantindo que cada município tivesse condições técnicas, pedagógicas e de infraestrutura adequadas para implementá-las. O arranjo institucional da COPEM, casado com instrumentos de monitoramento e mecanismos de incentivo à cooperação e foco nos resultados educacionais possibilitaram que os municípios caminhassem junto ao estado em direção à melhoria da aprendizagem no Ceará.

Os resultados do PAIC e das outras ações da COPEM no Ceará são notáveis.

A partir de 2007, o estado e seus municípios alcançaram grande destaque nos indicadores de aprendizagem. Em 2015, todos os municípios cearenses cumpriram as metas estipuladas no IDEB para os anos iniciais do Ensino Fundamental e o estado é o que tem a menor desigualdade de aprendizagem entre os estudantes mais ricos e pobres, tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais da etapa. Desde o começo do PAIC, o percentual de alunos nos níveis Muito Crítico e Crítico em matemática no 5o ano do Sistema Estadual de Avaliação da Educação Básica (SPAECE) melhorou consideravelmente, passando de 80% para 31,7%.

Sem dúvida o regime de colaboração no estado do Ceará traz diversas lições para a educação brasileira. Além dos exemplos práticos do modelo de governança e das ações implementadas que levaram à melhoria da aprendizagem, o caso da COPEM e do PAIC mostra a importância de fundamentos e valores bem estabelecidos na elaboração da política pública. Junto às outras experiências exitosas de regime de colaboração no Brasil, esse caso mostra que é possível melhorar substancialmente a educação por meio do apoio aos municípios e gera vários insumos para o estabelecimento de fatores de sucesso a serem observados pelos gestores que queiram fomentar esse tipo de iniciativa no futuro .


LEGISLAÇÃO: AFINAL, O QUE É REGIME DE COLABORAÇÃO?

A expressão regime de colaboração, aplicada ao contexto da educação no país, foi utilizada pela primeira vez na Constituição Federal de 1988. Diz a carta magna brasileira, em seu Art. 211, que “[a] União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”. Esse mesmo artigo define que cabe aos Municípios atuar prioritariamente na educação infantil e no ensino fundamental e aos Estados e Distrito Federal, no ensino fundamental e médio. A União, por sua vez, e como indica o Art. 22, XXIV, deve legislar sobre diretrizes e bases de uma educação nacional. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), a expressão também é mencionada nos Art. 8 e 62, enfatizando, no primeiro, a organização da educação em regime de colaboração pelos entes federativos, e no segundo, a garantia da formação docente, em seus diferentes estágios, por meio de ação colaborativa entre União, Estados e Municípios.

Percebe-se porque, então, a colaboração entre os entes é necessária, pois, apesar de termos organizado a educação nacional a fim de garantir um direito a todos os cidadãos com qualidade e equidade, as responsabilidades pela oferta da educação foram distribuídas de maneira descentralizada. O regime de colaboração, portanto, deve se concretizar na prática pela implementação de estratégias/mecanismos voltados para a coordenação e a cooperação entre os entes envolvidos, construindo uma estrutura pela qual as gestões concretizam a coordenação e a cooperação entre si.

Essa concretização pode se dar de algumas formas por meio de políticas transversais que envolvam a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios ou parte deles, por meio de instâncias que garantam o diálogo e a pactuação entre os diferentes entes. Porém, é importante ressaltar, que não contamos com previsões legislativas que orientem ou induzam os Estados a trabalharem de maneira pactuada, em regime de colaboração, dentro do seu próprio território. Por isso, para qualquer um dos meios, é imprescindível garantir a construção e ou revisão de marcos legais e normativos que institucionalizem e garantam maior robustez aos esforços colaborativos que se deseja implementar.

Ao instituir uma política colaborativa junto aos Municípios, você, Gestor/a, terá de conhecer todos esses marcos legais e normativos e suas características. Afinal, e como veremos ao longo do Guia, a política deverá garantir em sua governança instâncias de pactuação junto aos Municípios e respaldo legal. No caderno de recursos é possível ver um exemplo de Termo de Pactuação do PAES e as Leis de ICMS dos estados do Ceará -Lei 14.023/07- e Pernambuco -Lei 16.616/2019-, que alteraram a distribuição da cota-parte aumentando o acesso aos recursos de Municípios com melhores desempenho em educação. Note que é imprescindível ter as contrapartidas de todas as partes envolvidas para maior garantia do cumprimento das ações que se quer realizar.

Para além das contrapartidas, as seguintes características devem ser consideradas na construção dos marcos legais de sua política colaborativa: clareza quanto às atribuições de cada ente federativo; respeito à autonomia de cada ente envolvido; conhecimento e análise da(s) legislação(s) vigente(s), a fim de garantir que os marcos legais que serão construídos para a política colaborativa não estejam de encontro com aquilo que já é normatizado; aperfeiçoamento da organização e da coordenação entre os sistemas de ensino; e contribuição para a concretização do direito de aprendizagem de todos.

Por fim, vale ressaltar que a elaboração de leis e normas é algo bastante complexo e específico. Por essa razão, recomenda-se fortemente que os setores jurídicos das secretarias estaduais e municipais estejam envolvidos nessa etapa.